Teses sobre a ecologia social
Murray Bookchin (1921-2006) e Janet Biehl (1953-) |
Esta é uma tradução de partes do texto de Janet Biehl, intitulado Teses sobre a ecologia social e ecologia profunda, escrito em 1º de agosto de 1995. O texto foi originalmente disponibilizado no site do Institute for Social Ecology. A tradução, baseou-se no mesmo texto disponível na The Anarchist Library.
O mérito de Biehl é condensar em teses, a complexidade do pensamento de Murray Bookchin, que foi elaborado a partir de um diálogo crítico e racionalista entre filosofia da natureza e teoria social, realizado pelo autor entre os anos 1950 e 2000.
Raphael Cruz
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TESES SOBRE A ECOLOGIA SOCIAL
Janet Biehl
I
A ecologia social argumenta que a ideia de dominar a natureza resultou da dominação do humano pelo humano, e não o contrário. Ou seja, as causas da crise ecológica são, em última instância e fundamentalmente, de natureza social. A emergência histórica de hierarquias, classes, estados e, finalmente, a economia de mercado e o próprio capitalismo são as forças sociais que produziram, tanto ideológica quanto materialmente, a atual espoliação da biosfera.
II
A ecologia social vê o mundo natural como um processo – e não apenas qualquer processo, mas um desenvolvimento em direção à crescente complexidade e subjetividade. Este desenvolvimento não foi predeterminado desde o início e não precisava ter ocorrido, mas retrospectivamente a complexidade crescente da evolução natural e o desenvolvimento de subjetividade crescente são impossíveis de ignorar. Com o surgimento dos seres humanos, os processos evolutivos biológicos (primeira natureza) continuaram e foram suprimidos por processos evolutivos sociais e culturais (segunda natureza). Ao contrário da sociobiologia, que reduz o social ao biológico, a ecologia social enfatiza as gradações entre a primeira e a segunda natureza: a segunda natureza emergiu da primeira natureza. No entanto, a fronteira entre a natureza humana e não humana é real e articulada.
III
A ecologia social visa reintegrar o desenvolvimento social humano com o desenvolvimento biológico, e as comunidades humanas com as ecocomunidades, produzindo uma sociedade racional e ecológica. A mera presença biológica de humanos em grande número não determina o tipo de sociedade que formarão. Mesmo um grande número de seres humanos é capaz de organizar a sociedade de acordo com linhas que não apenas não destroem a natureza primária, mas até a aprimoram. Uma combinação sensível de ecotécnica e tecnologias existentes aplicadas com prudência constitui a base tecnológica para a pós-escassez, proporcionando aos humanos, tempo livre para administrar os seus assuntos sociais, políticos e econômicos de acordo com linhas racionais e promover e restaurar a complexidade ecológica da primeira natureza.
IV
A ecologia social afirma abertamente que os seres humanos são potencialmente a forma de vida mais avançada que a evolução natural produziu, em aspectos cruciais de inteligência, capacidade moral e destreza - o que de forma alguma fornece uma licença para os humanos destruírem arbitrariamente a primeira natureza. De fato, numa sociedade racional, os seres humanos poderiam ser a natureza tornada autoconsciente. Claramente, faz parte da sua composição evolutiva intervir no mundo natural; o que não está determinado é se essa intervenção será ecologicamente benigna ou maligna, um problema que é resolvido pelo tipo de sociedade que eles criam.
V
A ecologia social, embora enfatize fortemente a necessidade de uma sensibilidade ecológica, de fato uma ética da complementaridade, afirma que enfrentar a crise ecológica requer engajar-se em atividades sociais e políticas para confrontar e, finalmente, eliminar as suas causas sociais objetivas: o capitalismo, a hierarquia social e o Estado-nação. A dimensão política da ecologia social, o municipalismo libertário, é um programa para estabelecer democracias diretas, face à face e confederá-las num poder dual para enfrentar essas forças. A ecologia social situa-se assim na tradição iluminista e revolucionária.
VI
A ecologia social argumenta que uma das características distintivas dos seres humanos, a sua capacidade de raciocinar num alto nível de generalidade, dá-lhes a capacidade de entender potencialmente os processos naturais e potencialmente organizarem a sociedade de acordo com linhas ecológicas e racionais. Ao mesmo tempo, em que critica as reivindicações onipresentes de um racionalismo de “meios-fins” que historicamente instrumentalizou fenômenos humanos e não humanos, ela avança um raciocínio dialético que é apropriado para compreender os processos evolucionários sociais e naturais humanos. Em si, ele incorpora esse compromisso com a racionalidade ao defender e demonstrar coerência no pensamento social.
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