Futuros anarquistas na periferia capitalista


No dia 27 de agosto de 2022, participei da 7ª Conferência da Anarchist Studies Network, através do painel Is it future or is it past, junto à Saptadeepa Benerjee e Luciano Oneto.

A minha apresentação seguiu o mote da 7ª conferência da ASN, que se interessava em trabalhos sobre como anarquistas pensam ou pensaram o futuro.

Comentei sobre três casos de futuros societários imaginados nos parâmetros da tradição anarquista, isto é, no autogoverno (federalismo político) e na autogestão (socialismo econômico). 

Nesse sentido, analisei três programas e constituições políticas anarquistas para o Brasil elaboradas entre a I e a II guerras mundiais, por militantes tais como José Oiticica e Edgar Leuenroth, importantes personagens da contestação política brasileira da I República, e por ativistas menos conhecidos como o cearense Moacir Caminha e o português de nasicmento Helio Negro, pseudônimo de Antonio Candeias Duarte.

Como referencial teórico, baseei-me na noção de "práticas constitucionais", elaborada por Kinna, Prichard e Swann (2009). 

Identifiquei que nos três casos selecionados, havia o uso da linguagem federalista do sindicalismo revolucionário (conselhos, federações) misturada com a linguagem constitucional de republicanismo (constituição, república) para organizar a sociedade do futuro.

Cheguei a conclusão, que a imaginação política, agenciada pelos autores dos documentos estudados, tinha em comum serem uma espécie de síntese das tradições republicana radical e sindicalista revolucionária.

Por meio dessa síntese programática, que unia dois imaginários políticos, foram pensados "Brasis" politicamente autogovernados e economicamente autogeridos pela sociedade, destituindo, assim, a centralização de poder (Estado) e a concentração de riqueza (capitalismo) de qualquer utilidade para a vida social brasileira.

Abaixo, segue o resumo que consta nos anais da citada conferência.

Raphael Cruz

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ANARCHIST FUTURES IN THE CAPITALIST PERIPHERY: CONSTITUTIONAL PRACTICES AND POLITICAL IMAGINATION IN BRAZIL (1919-1945) 

In "Against Kamikaze Capitalism", David Graeber (2011) stated that since the 2008 financial crisis, "we have been left in the bizarre situation where it is clear to everyone that capitalism doesn't work, but it's nearly impossible for anyone to imagine anything else.

The war against imagination is the only one the capitalists have really managed to win". By undermining creativity, the very existence of other worlds would be compromised. Indeed, imagination is a battleground. To imagine future egalitarian societies is to do politics by other means.

Since Mikhail Bakunin, the destruction of the old world of state domination and capitalist exploitation is not a nihilistic act, but a constructive one. It was he himself, under the pseudonym Jules Elysard (1842), in his formative years as a Left Hegelian, who emphasized the necessary dialectic between destruction and creation by stating that "die Lust der Zerstörung ist zugleich eine schaffende Lust!"

In a period in which the capitalists seemed not yet to have won the war against political imagination, Brazilian anarcho-syndicalist and anarcho-communist militants elaborated between 1919 and 1945, anarchist constitutions for the country. In this communication, I will present three constitutional texts written by militants who sought to imagine anarchist republics in Brazil. I seek to identify the statements of principles, institutional arrangements, rule-making processes, and decision-making procedures proposed in these constitutions (Kinna, Prichard, Swann, 2019).

I argue that the texts 1) express ways of imagining futures of equality and freedom for the Brazilian people; 2) through an “anarchist constitutional politics” (Kinna, Prichard, Swan, 2019) ; 3) in the period of the capitalist world wars; d) from an anarchist perspective located in the economic and post-colonial periphery of the world-system.

Raphael Cruz


References

GRAEBER, David. Revolutions in reverse: essays on politics, violence, art and imagination. Londres: Minor Compositions, 2011.

KINNA, Ruth; PRICHARD, Alex; SWANN, Thomas. Occupy and the constitution of anarchy. Global Constitutionalism, v. 8, n. 2, p. 357-390, 2019.

NEGRO, Helio; LEUENROTH, Edgar. O que é o marxismo ou bolchevismo - Programa comunista. São Paulo: s/e, 1919.

OITICICA, José. Princípios e fins. Spártacus. Ano I, nº3, Rio de Janeiro, 16 de agosto de 1919, p. 01.

OITICICA, José. Previsões práticas. Spártacus. Ano I, nº3, Rio de Janeiro, 23 de agosto de 1919, p. 01.

CAMINHA, Moacir. Remodelações, 15 e 22 de dezembro de 1945. In: RODRIGUES, Edgar. A nova aurora libertária (1945-1948). Rio de Janeiro: Achiamé, 1992.

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