Bakunin e a política etnográfica
Nikolai Yaroshenk. O estudante, 1881 |
Em 1922, Malinowsk publicou sua etnografia sobre os trobriandeses. Nos anos 1940, a Escola de Manchester em antropologia, capitaneada por Max Gluckman, etnografou a política entre povos africanos.
Em Malinowski, a etnografia ganhou sua face contemporânea. Por meio dos africanistas de Manchester emergiu uma etnografia política.
Sugiro que num escrito de Mikhail Bakunin está implícita uma política etnográfica ao invés de uma etnografia política. O referido texto trata da aplicação de um método para-etnográfico para a compressão do campesinato russo, visando a agitação, propaganda e organização de massas com fins políticos revolucionários.
No texto Aonde ir e o que fazer? (1873), Bakunin instigou a juventude russa a ir ao povo para conhecê-lo e organizar junto à ele uma revolução social. Constituiu-se num apelo para a juventude universitária russa trair politicamente sua origem de classe aristocrática e se misturar ao campesinato.
Nikolai Yaroshenko. A estudante, 1883 |
No verão de 1874, ocorreu uma massiva ida de jovens às comunidades rurais. Esta foi a primeira aproximação em massa de estudantes socialistas com o campesinato russo.
Esse evento entrou para a historiografia com o nome de movimento "ir ao povo". Expressou uma evolução importante em relação à juventude russa da década passada. Pois, os niilistas dos anos 1860 canalizavam a rebeldia para discussões metafísicas e para o fatalismo.
Vasily Vereshchagin, Retrato de um camponês, s/d |
No referido texto, Bakunin indicava os meios para conhecer o campesinato russo in situ. O método é incrivelmente semelhante à etnografia, contudo, o objetivo é político.
"Os detalhes que se repetem cotidianamente são bem amiúde mais importantes e mais dignos de observação do que fatos proeminentes dos quais, evidentemente, nenhum escapará à vossa atenção. Estudando minuciosamente a vida material das pessoas simples que vos cercam, buscai penetrar o fundo de sua alma, seus hábitos coletivos no plano mental e moral, suas diversas relações na família e na sociedade bem como a razão secreta de sua atitude em relação aos outros corpos sociais e as autoridades. O que pensam eles de seus direitos e de suas humilhações que, evidentemente, não faltam em nenhum lugar na Rússia? O que querem, a que aspiram e esperam algo? E de quem?".
Algumas considerações extraídas do parágrafo:
1) observar o cotidiano camponês
2) sem desprezar os "fatos proeminentes"
3) iniciar pela "vida material"
4) em seguida, a vida cultural
5) e o comportamento político
Anos depois, militantes do amplo espectro socialista russo abandonaram a condição social de classe média ou aristocrata. Eles se tornaram operários de fábrica na intenção de agitar e organizar trabalhadores urbanos. No Brasil dos anos 1960, esse método foi chamado proletarização.
Raphael Cruz
Observação: esta postagem foi modificada em 8 de julho de 2023.
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